Veja só você. Que costumava ter sonhos. Ser independente. Ser absolutamente independente. Viajar pra qualquer lugar que te desse calma. Tocar suas músicas favoritas num quarto fechado, só você e o piano até os dedos sangrarem. Se casar descalça cercada de flores do campo, muitos amigos, uma banda ao vivo e aquele vulto à direita devia ser o homem mais feliz do mundo.
Veja só você, que queria morar perto do mar, morar longe de tudo, “ter um jardim bem frequentado por borboletas”, trabalhar apenas o suficiente pra ter uma vida digna, sem juntar celeiros. Você que queria ter um golden, e um beagle, e um cachorro daqueles magricelas e altos, de corrida.
Você que cantava, escrevia, desenhava e emocionava. Que queria ser mais artista ainda. Queria aprender mais sobre tudo. Eu te admirava tanto e tinha tanto orgulho de você que até quis ser como você quando crescesse. Eu quis, mas hoje… Eu tenho vergonha de quem você se tornou. Alguém que tatuou “felicidade” no braço pra se lembrar que isso existe.
Sua independência te ilhou, sua arrogância te fez excluir da vida muitos amigos que você poderia ter tido. Você se achava tão ocupada (e superior) que preferia fingir de demente mental na faculdade pra ninguém se interessar em puxar um papo, aquelas pessoas eram pequenas demais pra você. Hoje não adianta tentar recuperar o tempo perdido porque sua postura assusta as pessoas com quem você tenta interagir. Como resultado você ficou tão fraca e carente sozinha que não é capaz de se imaginar realizando o sonho de viajar por não ter alguém pra compartilhar o lugar, por mais tranquilo e bonito que pareça o destino.
Você se acha tão pequena que diz por aí que não acredita em amor e que nem sabe o que é, só pra disfarçar o medo gigante que você tem de ninguém amar você assim, desse jeito torto, essa pessoa totalmente em migalhas que você se tornou. Hoje, pra se achar o “homem mais feliz do mundo” por estar com você, ele teria que ser cego, sem perspectivas e um fraco. Você chegou aos 27 anos sozinha. Uma pessoa que tinha sonhos tão bonitos para serem compartilhados e um potencial incrível, mas que fugiu de todos os homens bons que quiseram estar com você.
Você trabalha, trabalha, trabalha e gasta o que ganha com superficialidades. Você não tem paciência pra ler um livro, pra pintar, pra voltar às aulas de música e nem pra visitar os seus pais. Como se não bastasse tudo isso, o grand finale onde você assina o atestado de perdedora, a desistência da casa perto do mar, do jardim, das borboletas, dos cachorros se deu por você não acreditar que dá pra ser feliz dentro desse sonho mesmo estando sozinha.
Quantas chances uma pessoa tem de errar na vida? Porque, cara, você deve estar já no limite. Eu realmente quis ser como você, mas você mudou tanto que eu nem te reconheço mais.