Sinceramente, mãe.

Obrigada por não me dar nada de mão beijada. Obrigada por não passar a mão na minha cabeça quando eu errava. Obrigada por não passar a mão na minha cabeça quando eu acertava. Obrigada por ter me dado uma única escolha na vida. Sim, uma escolha, porque todo resto você decidia por mim. Mas ok, eu sou agradecida pela única escolha:
“Você mora na minha casa, come da minha comida, e o dia que você quiser fazer as suas escolhas você tem que morar na sua casa e comer da sua comida.” Sério, mãe. Obrigada. Obrigada porque, apesar de que com mais de 20 anos eu ainda não sabia fazer escolhas, apesar deu ter errado pra caraca tentando um monte de coisas, eu acertei no final. E quer saber? Eu tenho alma jovem. Ainda tenho muitos anos pra viver acertando.

Obrigada pelo seu único conselho que eu guardei: “seja criativa!”. Eu nunca vou esquecer esse conselho e, apesar de ser um só, apesar de ser tão pequeno, absolutamente TUDO o que eu tenho hoje é por causa desse conselho. E os conselhos sobre moral, eu vou pular. Está quase chegando o seu dia e não vamos falar sobre coisas ruins, né?

Obrigada pelo seu exemplo ético, porque eu aprendi a ser uma pessoa digna vendo suas ações. Tirando o fato que nenhuma babá parava lá em casa porque não aguentava você, mas até nisso eu prefiro acreditar que você queria, apenas, o melhor pra mim e pra minha irmã.

Obrigada, mãe, por, às vezes, reconhecer. E também obrigada por, às vezes, ser exatamente como era quando eu era criança, isso me lembra que na guerra, a gente não pode fechar os olhos por nenhum segundo. Isso é útil, mãe.

Obrigada por orar por mim todos os dias, desde o meu primeiro suspiro de vida eu tenho certeza que você não deixou de fazê-lo um único dia. Obrigada por ter aguentado todas as vezes que eu, criança, disse “eu não pedi pra nascer!”. Ora, você com a minha idade já tinha duas filhas, trabalhava muito mais que eu, ganhava menos e hoje eu entendo perfeitamente que você também não deve ter pedido.

Obrigada pela lição que você me deu faltando à minha formatura da oitava série. Quando eu disse que todas as meninas da turma estariam lindas, mas que você nunca se preocupava com minha aparência. Você me deu um vestido lindo, cordão, brincos… e não foi. Eu entendi. Demorei um tempão, mas depois eu entendi. Não entendi ainda porque você faltou a todas as outras formaturas. Mas o erro deve ter sido meu de não pegar no ar a lição. Obrigada por não desistir de ser minha mãe, mesmo depois de eu ter desistido de tentar ser sua filha. Uma filha normal com uma mãe normal, sabe? Amor, carinho, proteção, cuidado, essas coisas?

Obrigada por tentar o seu melhor, mesmo sem saber nada. Você nunca se omitiu, apesar de ser tão ruim, até pior que eu, fazendo escolhas, mas ok, você nunca se omitiu e sabe-se lá o que eu poderia ser se você se omitisse. Então obrigada. Eu não acredito nos seus métodos e pretendo não seguir o seu exemplo de mãe, mas eu não tenho a menor dúvida que você acreditava ser o melhor que poderia fazer. Obrigada por me dar o seu melhor.

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